Francisco Mota, 39, está sendo assistido na Casa de Cuidados do Ceará (CCC), unidade de desospitalização da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa), há dois meses. Nesse período, ele despertou a atenção dos outros pacientes e de profissionais devido ao talento e olhar apurado com o desenho.

“Desde quando estava internado em um hospital municipal que tenho esse lápis, mas foi na Casa de Cuidados que voltei a desenhar com mais frequência. Gosto de fazer isso desde a infância, inclusive já cheguei a vender meus desenhos na Avenida Beira Mar”, relembra. Segundo ele, o hábito traz leveza na rotina de tratamento. “Isso ajuda a me distrair, eu paro de pensar em problemas”. Já a inspiração vem da própria rotina na Casa. “Gosto de desenhar o que envolve a Casa, principalmente as paisagens, sou apaixonado por elas e aqui o ambiente é muito bonito”, explica.

Francisco trabalhava como caseiro, cuidando de fazendas e animais. Mora em Itapajé, mas também já morou em Rondônia. Tinha uma vida nômade, até que um acidente no dia 17 de abril mudou totalmente a rotina dele e o obrigou a ficar imóvel. O talento, porém, continuou intacto, assim como a paixão pelo desenho.

Ele iniciou sua jornada de tratamento em um hospital da rede pública e depois foi transferido para a Casa de Cuidados do Ceará, onde está em processo de reabilitação. “Estou com mobilidade reduzida, mas graças ao apoio de toda a equipe estou melhorando. Estive acamado, depois passei para a cadeira de rodas e agora já estou fazendo testes com muletas. Toda essa evolução registrei em desenho. Assim que tiver alta, vou entregar à equipe e sugerir que façam um quadro para deixar essa lembrança aqui na Casa”, sugere, empolgado.

O paciente também desenhou outros pacientes, profissionais e a natureza. “Apesar do meu problema de saúde, aqui está sendo uma experiência incrível. Além de desenhar, também gosto de ler, especialmente livros religiosos e de autoajuda. Tudo isso tem ajudado a tornar a jornada mais leve e as pessoas desenhadas estão adorando porque consideram como uma forma de homenagem”.

Prática é incentivada na unidade

Esse hábito de Francisco é incentivado pela equipe da Casa de Cuidados com outros pacientes por meio do “cantinho literário”, um espaço que oferece livros, jogos e desenhos para pintura aos pacientes em tratamento na unidade. De acordo com a terapeuta ocupacional da CCC, Gardênia Leão,atividades de desenho e leitura estimulam as questões cognitivas do corpo, colaborando para o tratamento do paciente. “É além de um passatempo, pois essas atividades evitam o declínio cognitivo, estimulando corpo e mente e promovendo melhoria do humor”, explica.

Sarah Gomes, psicóloga do equipamento de saúde, acrescenta que as atividades também beneficiam a saúde mental dos internados. “Elas ajudam a desacelerar o pensamento, pois direcionam a atenção para outro espaço. Além disso, a depender dos desenhos, das pinturas ou até mesmo do conteúdo da leitura, isso também remete à história de vida do paciente, ele se sente conectado com a própria identidade, com os seus valores”.

A Casa de Cuidados do Ceará também possui grupos voltados para arteterapia e outros processos terapêuticos. Os coletivos são formados por cuidadores ou por quem está recebendo assistência. Antes sugerido para crianças durante o aprendizado escolar, os atos de desenhar e pintar são cada vez mais incentivados para adultos, visto que promove o alívio do estresse e diminui a ansiedade.

“O hábito promove sentimentos de calma, alívio e expressão das emoções. A arte é uma forma de expressão, pois o autor desenvolve no papel aquilo que está sentindo”, conclui Ariana Matias, também psicóloga da unidade de cuidados.